Por que não acolhem nossa raiva?

Foto de Life Matters no Pexels

Já fui chamada de nega metida. Já fui chamada de nega raivosa. Já me apontaram que eu era agressiva. Já disseram que eu estava sendo injusta e exagerando. Fui polida. Fui silenciada. Amordaçada. Que possibilidades temos então, além de vestir uma armadura e seguir em frente? E a nossa raiva, por que te incomoda? Será que não temos motivos para ter raiva? Todos os dias nos matam, nos humilham, nos invisibilizam, nos inferiorizam. Nos matam literal e simbolicamente. Será que isso não é motivo suficiente?

Nós cantamos “fogo nos racistas” mas não saímos por aí ateando fogo em ninguém. Vocês nos ateiam fogo há séculos. E esperam que sejamos calmxs? Nos cobram que falemos de racismo com doçura e amor. Nos cobram paciência para educarmos xs brancxs. Como falar com amor de uma ferida que nunca sara? Uma ferida que a cada dia se torna mais profunda e mais inflamada.


Cansa demais falar. Dói muito falar, e dói não falar também. Dói não ser ouvida. Queria saber como é poder não precisar falar, não precisar sentir, e poder apenas assistir (para aquelxs que assim se comportam). Deve ser menos doloroso. Queria saber como é não se preocupar se sua irmã, irmão, sobrinho, pai, tio, voltará vivx para casa após uma simples ida a um supermercado.

Deve ser muito bom não viver essa dor. E ainda nos pedem calma, amorosidade e paciência. Nesse momento, vou tratar de guardar essa amorosidade e paciência às (aos) minhas (meus) iguais. E tu, pessoa preta que lê isso, sinta sua raiva. Abrace sua raiva e toda sua dor. Elxs não querem que abracemos isso, porque continuam nos vendo como animais e objetos. Continuam nos desumanizando. Se permitir sentir tudo isso em toda sua complexidade é se humanizar, é ter controle e autonomia sobre seu corpo. Então permita-se sentir e expressar-se.

É isso… A neguinha raivosa se pronunciou. 

** Este artigo é de autoria de colaboradores do PORTAL BAOBABE e não representa ideias ou opiniões do veículo. O Portal Baobabe oferece espaço para vozes diversas da esfera pública, garantindo assim a pluralidade do debate na sociedade.